segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Sous le ciel de Paris



Há dias que passam em branco, que são arrastados pela mesmice. E há dias recheados, plenos de emoções e acontecimentos. Dias inesquecíveis.
Não posso me queixar.
Tenho vivido dias intensos,  nesta minha jornada pela Europa.

Em Londres, afetivamente intensos. O reencontro com Isabela, a possibilidade de participar de sua rotina na cidade, conhecer seus amigos e fazer minhas próprias descobertas, tudo foi muito especial.

Mas,  fim de curso pede férias.
Destino? Sul da França. Uma viagem em busca dos sabores e aromas da Provence.

As milhagens foram suficentes para a viagem de avião, mas teríamos de ir por Paris, já que não consegui vôo direto para Lyon.
Fui obrigada a fazer o "sacrifício". Uma passadinha. Menos de 24 horas em Paris.







Viajar de avião nem sempre é a melhor alternativa. Tem-se de chegar ao aeroporto com algumas horas de antecedência, para enfrentar as filas de check in e todas as exigências de controle de passaportes e bagagens das autoridades locais.
E começou cedo nossa maratona.

Havíamos nos deitado tardíssimo na noite anterior, depois da  festa de encerramento do Cordon Bleu e acordamos às 6 da manhã. O aeroporto de Londres, Heathrow, fica longe da casa da Isa e, como preço do táxi é bem alto por estas bandas e levaríamos apenas uma mala pequena cada uma, resolvemos ir de metrô.
Acontece que as linhas diretas de metrô que levam ao aeroporto estavam em reparos, naquele sábado.  Tivemos de fazer mil baldeações, mudando de linhas e completando o trajeto de ônibus para, enfim, chegar ao nosso terminal. Depois das filas, conferências e revistas de praxe, ainda  esperamos horas para embarcar porque  problemas de tráfego aéreo atrasaram todos os vôos. Resultado: só chegamos ao aeroporto de Paris às 4 da tarde.

Muito tarde? Ainda tem mais.

O aeroporto ali estava um caos e não havia nenhum trem naquele dia partindo de Charles de Gaule. Tivemos de pegar uma navette cdgval para ir até um outro terminal e lá pegamos um ônibus até uma cidadezinha dos arredores, onde pegamos , enfim o trem até Paris.




Já passava das 6h00 da tarde.
Estávamos famintas e exaustas, mas foi só chegar e sentir o incrível charme da cidade, para saírmos mais que depressa do hotel e cairmos no mundo!
Impossível resumir o quanto aproveitamos Paris. Talvez justamente  porque não tivéssemos quase tempo, conseguimos extrair dela o máximo possível em menos de um dia.




Nosso hotel era minúsculo, mas muito bem localizado, a poucos passos da estação Clunny- La Sorbonne e, assim, subimos o Boulevard Saint-Michel até a Fontaine de Saint-Michel e lá estávamos nós passeando pelas margens do Sena, com seus bouquinistes, em meio a uma multidão de pessoas desfrutando, ainda, daquele lindo dia de sol, um presente para esta época.

Fomos então à Notre- Dame e depois nos embreamos pelas ruazinhas da Rive-Gauche, passando pelo Pantheón, pela Igreja de Sainte-Geneviève,  continuando em direção às Arenes e ao Jardin de Plantes.

Como nem tínhamos almoçado, aproveitamos para jantar no maravilhoso Hamamm da Mosquée de Paris.
Alimentadas e descansadas, voltamos a pé lentamente, passeando pela região da Sorbonne e pelo Quartier Latin, fervilhando na Rue Saint-Severin, com seus restaurantes multi-raciais lotados.




Tomei um sorvete de morango e depois fomos para  a Rue Saint-Andrè-des-Arts. Adoro aquele pedaço, cheio de ruelas e passagens. E, claro, fiz questão de mostrar à Isabela o restaurante mais antigo de Paris, onde políticos e intelectuais se encontravam desde meados do século XVII - o  Le Procope.
Depois, continuamos nossa jornada pelo Boulevard Saint-Germain, passando pela Igreja de Saint-Germain-de-Prés e pelos famosos cafés Les Deux Magots e Café de Flore, que eram frequentados por artistas e intelectuais do século passado, como Sartre, Simone de Beauvoir, Picasso e Camus.



Voltamos a pé para o Hotel, mais de meia noite.


No domingo, depois do café da manhã  já saímos para aproveitar mais um pouco de Paris.

O tempo  não estava tão aberto e até choveu um pouco. Mesmo assim, como ainda estava tudo fechado, pegamos o metrô e fomos para a Rue de Bac, visitar a Capela da Medalha Milagrosa. A seguir, fomos de metrô para Madeleine. Demos uma volta por lá e então fomos até Les Halles. Dali, fomos caminhando até o Museu Georges Pompidou e descansamos na incrível praça vizinha com instalações da Nicky de Saint- Phalle. Voltamos  devagar, apreciando a cidade. Passamos pelo Hotel de Ville, atravessamos as pontes sobre o Sena, descansamos mais um pouco na praça em frente à Notre Dame.


De lá, caminhamos sem pressa, fuçando várias lojinhas, já todas abertas, então. A Isa comprou um vinil raro num  sebos de discos e eu, para variar, comprei mais um bloco de anotações e um livro.

Chegamos ao hotel quase três da tarde, pegamos as malas e fomos de ônibus para a Gare de Lyon, onde compramos uma baguete enorme recheada de presunto cru, alface e tomate seco,  almoço que comemos como um banquete no trem que  nos levou para Lyon.


Estávamos novamente famintas e exaustas, mas felizes da vida. Paris sempre vale a pena. Mesmo só por algumas horas. Tem sabor de quero mais.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

A festa





A festa de encerramento do Cordon Bleu foi maravilhosa. Coisa de sonho, mesmo. O prédio da Royal Court of Justice, o capricho como as mesas foram montadas, a comida deliciosa e sofisticada, a alegria dos professores e dos alunos...






Foi tudo ótimo, tirando a maldita dor nos pés, lembrança deixada até o dia seguinte, pelos sapatos de salto!











 Isabela estava muito feliz...












E eu tentei registrar o momento. Não fui muito bem sucedida, porém. Por se tratar de um prédio de acesso restritíssimo, cheio de formalidades e medidas de segurança, onde é proibido fotografar, minhas fotos transgressoras saíram tremidas ou escuras. Mesmo assim tentei. Imaginem se eu perder a oportunidade!

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

O grande dia






Hoje vai ser um dia corrido por aqui. É o dia da cerimônia de graduação da Isabela no Cordon Bleu. 

Estou toda orgulhosa. É um privilégio poder cursar a mais tradicional e bem conceituada escola de Gastronomia  que há por aí.

Nunca pensei que minha filha mais nova viesse a ter esse amor pela cozinha. Para mim, isso é ótimo.
Ofereço-me de bom grado como cobaia de suas criações, pois é muito bom acompanhar suas experiências gastronômicas. 
Desde que ela se enveredou por esse caminho e, mais ainda aqui na Europa, passei a olhar para os alimentos de outra forma, encantando-me também com cores, sabores e aromas.




Hoje será o jantar de encerramento de seu curso, em alto estilo.
E amanhã embarcamos para mais uma aventura gastronômica. Vamos viajar juntas para conhecer mercados, ingredientes e a cozinha de outros chefs. 
E, claro, lá vou eu. Toda feliz...



segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Velhinhos de Londres

Já que o tempo é impiedoso, que a velhice seja, ao menos, generosa. E que venha assumida, confortável, autêntica e até um pouco ousada. São assim os velhinhos que tenho encontrado, aos montes, aqui em Londres. Difícil passar por uma rua em que não se veja ao menos uma pessoa bem idosa, sozinha ou acompanhada de seus pares. Sempre falando com alguém ou até confabulando com os próprios botões, tocam suas vidas com independência, apesar dos prováveis reumatismos, artrites, artroses e outros ismos, ites e oses.  A diferença é que, aqui, as eventuais  limitações físicas não os impede de sair de suas casas  para ocupar os bancos das praças ou dos ônibus, que, aliás, são preparados para facilitar o acesso aos passageiros, inclusive cadeirantes.
Da janela deste apartamento, acompanho, quase todos os dias, a movimentação de uma senhora bem idosa, que, anda curvada, empurrando sua sacola/bolsa xadrez de rodinhas. Sempre de "rouge" e batom, um colar de pérolas ou um lenço colorido no pescoço, às vezes um turbante ou um chapéu. Lá vai ela, orgulhosa de si, seguindo com seu passinho lento pela avenida e exibindo seus tênis dourados! Nenhum espanto. Nenhuma censura. As pessoas aqui andam como bem entendem. Ninguém se incomoda com a vida dos outros, no quesito aparência. É por isso que algumas velhinhas têm  cabelo cor de prata e outras cabelo azul. Algumas usam chapéus extravagantes e floridos. outras vestidos estampados ou de bolinhas enormes. E há até as que usam capa de chuva amarela! O visual é o mais diversificado possível não só o os jovens, como  o dos velhinhos da cidade. Flores na cabeça. Saia rodada de renda, curta ou comprida, com ou sem calça fuseau por baixo. Paletó estampado, listrado ou  xadrez. Gravata borboleta. Vê-se de tudo entre esses velhinhos estilosos. Há até os que continuam  roqueiros de alma,  com jeans surrados, inúmeras tatuagens e cabelão minguado, abaixo dos ombros.
Mas uma coisa é certa: os sapatos, por mais ousados ou caretas que sejam, serão sempre confortáveis. E as bolsas, para não pesarem, serão pochetes minúsculas ou sacolões enormes com rodinhas.
Nem mesmo as diferenças sociais parecem afetar a excentricidade da população idosa daqui.  Vê-se velhinhos elegantíssimos de camisa amarela, cashmere azul bebê e calça de veludo roxo e também mendigos chiquérrimos de terno de lã puída ou  de casaca preta,  lustrosa pelo tempo. E, se forem ingleses, todos exibirão um ar solene de dignidade, misturado a essa tendência um tanto ousada no vestir.
O melhor de tudo é vê-los integrando a paisagem, amparados pela segurança de andar sem perigo por onde bem entenderem e resguardados pelo absoluto desinteresse pela  aparência alheia.
Nos pontos de ônibus, nos parques, nos cafés e nas praças, esses velhinhos querem rua.
E as ruas parecem querê-los também.

sábado, 4 de setembro de 2010

Como deve ser a vida

Hoje saímos de casa para ir a Nothing Hill, bairro charmoso de Londres onde acontece aos sábados a tradicional feira de Portobello, muito frequentada por turistas. É uma verdadeira festa, com barracas e pessoas coloridas, coisas interessantes para se ver, comprar e comer. 

No ano passado, estive lá duas vezes e neste ano já ia repetindo a dose. Porém, antes de chegarmos à estação onde deveríamos descer, o metrô parou para reparos e todos os passageiros foram obrigados a descer na Oxford Street. 

A Oxford já é a sucursal do inferno na terra, tal o número de passantes lotados de sacolas, deslumbrados com as inúmeras lojas que existem ali. Agora imaginem recebendo centenas de pessoas  sumariamente despejadas do metrô em busca de uma reorientação nos pontos de ônibus! 

Num primeiro momento, seguimos a manada e lá fomos nós consultar mapas e direções. Em pouco tempo a Isabela começou a orientar vários turistas, que estavam ali mais perdidos do que cegos em tiroteio. E todos tinham o mesmo destino: Nothing Hill!

Não foi preciso pensar muito para resolvermos mudar de idéia.

Andamos um pouco pela Oxford em busca de outras paradas de ônibus, sem saber direito aonde ir. Até  rolou um estresse. Os lugares turísticos num sábado sem chuva aqui em Londres ficam todos lotados. Pensei em visitar a Torre de Londres, mas desisti  a tempo, quando o ônibus para lá vinha chegando. Com o joelho machucado, não me sentia muito disposta a estar em lugares tão cheios de gente. Foi então que a Isabela teve uma idéia brilhante. Andamos mais um pouquinho e  pegamos um trem.

Fomos para Greenwich! E as coisas foram acontecendo do jeitinho que eu gosto. Sem nenhuma programação.

Ao descer na estação de Greenwich, já notei uma certa atmosfera interiorana. Nada do burburinho da Oxford Street ou da Portobello Road. Porcentagem de turistas quase zero! 

Almoçamos num restaurante simpático e continuamos nosso passeio pela cidade. Fomos parar no Greenwich Market, um mercado que também acontece ali ao sábados. Parecia uma quermesse, com várias barraquinhas de comida,  frequentada pela população local. 

Passeamos pelas  barracas, experimentamos roupas e acessórios e a Isa até comprou um vestido lindo, modelo anos 50! 

Depois fomos ver a antiga Escola Naval e, por fim, fomos ao belíssimo parque de Greenwich, onde há um planetário, um museu e um observatório, com uma vista deslumbrante de Londres. 

E, claro, fomos "atravessar" o famoso meridiano!

Tiramos muitas fotos, conversamos, rimos. 

O passeio foi maravilhoso. Feito de descobertas, inclusive para a Isa, que já havia estado lá outras vezes. E o melhor de tudo é que foi acontecendo naturalmente, sem grandes planejamentos. 

Um passeio como deve ser a vida. Guiado apenas pela sintonia do bem querer.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Tombos, quedas e outras avarias...




Sou especialista em hematomas, esfolamentos e assemelhados. Vivo dando topadas em móveis, queimando mãos e braços em panelas quentes, escorregando em tapetes traiçoeiros.

Quando viajo, não é diferente. Coleciono, entre as lembranças dos lugares por onde passo, alguns ai, ai, ai, ui, ui, ui e pequenas cicatrizes.

Já fiquei um ano inteiro sem a unha do dedão do pé porque uma mala de mais de trinta quilos, de um casal de alemães, despencou do bagageiro do ônibus, bem em cima do meu pé. Quase desmaiei. E tive de receber atendimento médico de urgência porque mal conseguia respirar de tanta dor. Por sorte, isso aconteceu já no aeroporto de Milão,  na volta de minha viagem de estudos a Firenze. E me rendeu meses usando sandália, porque não conseguia colocar um sapato fechado no pé.

Antes disso, fiquei internada num hospital público em Atenas, o pior do mundo, em minha abalizada opinião de paciente. Ninguém falava inglês, minhas amigas não conseguiam explicar que eu era alérgica a vários medicamentos e os enfermeiros sumiram comigo sem deixar que elas me acompanhassem, colocando-me numa enfermaria fétida e cheia de velhinhas nas últimas, que recitavam ininterruptamente em grego mantras de consolação. Na primeira oportunidade, fugi do hospital, com o auxílio de minhas amigas que, clandestinamente,  conseguiram descobrir onde eu estava, e montaram um esquema de fuga, com todos os guardas do hospital em nosso encalço. Uma verdadeira aventura! 
Passei o resto das férias com uma infecção brava, fraca e desidratada, mas sobrevivi.

Também já rolei das escadas no apartamentinho em que morava em Firenze. Foi horrível. Eu não conseguia me segurar e fui caindo, caindo, caindo, até chegar no andar de baixo (o quarto era no sótão!). Fiquei um tempão ali imóvel, sem conseguir me mexer e, depois, mais de quarenta dias com o corpo todo enfeitado de hematomas.

Não sei porque, mas para eu cair não precisa de muito.

Em 1990,  primeira vez em que saí do país, fizemos, eu e toda a família,  uma viagem à Argentina. Ao chegar à Bariloche, estava andando de mãos dadas com minha filha do meio quando escorreguei no gelo, feito uma pata, e bati fortemente com a cabeça no chão. Desmaiei na hora. Doeu um pouco naqule dia e no outro, mas continuei aproveitando a viagem. Depois de muitos anos, tive de fazer um exame minucioso para diagnóstico de labirintite e a médica comentou que tenho uma cicatriz enorme no crânio de algum tombo feio que levei, mas que por sorte não abalou a parte neurológica. E é exatamente no lugar daquela batida na cabeça, em  Bariloche.

Também no ano ano passado, quando vim a Londres visitar minha filha mais nova, levei um baita tombo, logo no primeiro dia em que saí sozinha para dar um passeio.
Imediatamente fui socorrida por quatro ingleses e meio:  um casal de namorados, um senhor que lia seu jornal num café em frente e uma moça que empurrava um carrinho de bebê. Todos foram muito solícitos e o casal, inclusive, me levou à farmácia mais próxima para cuidar dos muitos arranhões, que sangravam. O mais engraçado é que eu estava, naquele momento, justamente tirando conclusões impróprias sobre a ausência absoluta de ingleses pelas ruas de Londres, pois só tinha me deparado até então com hordas e hordas de estrangeiros.

Agora, novamente em Londres, o tombo da vez foi ontem.
Estava eu, toda feliz, voltando para a casa de minha filha, depois de um lindo passeio no Hyde Park e no Kensington Park,  quando, já na rua onde ela mora, resolvi fazer umas comprinhas de supermercado.

É claro que me empolguei. Acho uma delícia poder comprar cerejas e morangos carnudos e perfumados, iogurtes maravilhosos, queijos fantásticos  a preços mais que convidativos para nós, brasileiros.  Além disso, comprei detergente, leite, pão, coisas que faltavam em casa.

Saí triunfante com minhas duas sacolinhas retornáveis - que já ficam de prontidão em minha bolsa, pois aqui, e na maioria dos países da Europa,  para se usar  saquinhos plásticos dos supermercados, tem-se de pagar por eles. 

Pois bem, quando faltavam uns cinquenta metros para chegar na casa de minha filha, pisei em falso e lá fui eu, meu casaco, minha bolsa e as duas sacolas solenemente beijar o chão.  Um estrago federal. 

Estourei o joelho, o detergente estourou em cima dos pães, os danones estouraram em cima dos queijos e das frutas e estas ficaram completamente esmagadas. E desta vez, nem inglês, nem estrangeiro para me ajudar a levantar.

Tive de me recompor devagarinho, recolher as compras avariadas e  ainda fingir que não tinha acontecido nada, pois tudo isso aconteceu bem em frente a um dos pubs mais movimentados do bairro.

Meu corpo ainda está bastante dolorido e meu ombro e joelho esquerdos estão uma lástima. Mesmo assim, já fiz as pazes com as ruas de Londres e hoje lá fui eu para mais dois passeios, que valeram muito a pena. 

Mas essa é uma história que fica para depois...